João Morais Barbosa, administrador do Grupo Reorganiza, entrevista João Barreto Fernandes, CEO da KW Lead Santos, a propósito das perspetivas do mercado imobiliário para o segundo semestre. Fique a saber tudo neste artigo que resume a entrevista (parte I) e pode ler em poucos minutos.
Como olhar para os últimos meses, para perceber o que nos espera quer na compra de imóveis quer no arrendamento?
É necessário olhar para os últimos meses dado que o setor imobiliário é reflexo da economia, dinâmica social e até pessoal dos indivíduos. Quando se adquire um imóvel é preciso sentir que o contexto económico está favorável.
No último ano as taxas Euribor têm estado baixas e estabilizadas, o que tem favorecido que a banca conceda crédito a habitação. Por outro lado, temos o PIB a recuperar com dificuldade, depois do ano catastrófico de pandemia. O PIB caiu 7,6% em 2020 e recuperou agora no primeiro trimestre, mas marginalmente, porque não era de esperar ainda um boom de toda a atividade económica.
As taxas de juro têm acompanhado as taxas de referência, e começaram agora a subir ligeiramente, o que pode sinalizar que as taxas subirão a curto prazo, mas isso ainda não é um facto e não há certeza.
O desemprego sofreu um pico muito agressivo no início da pandemia. Agora tem vindo a estabilizar, mas isso poderá não corresponder à realidade, uma vez que medidas como o lay-off, e as medidas ativas de emprego e formação, promovidas pelo estado, podem camuflar esta realidade. Se olharmos os números, é um facto que de janeiro para março de 2021 há mais 30 mil pessoas desempregadas.
A poupança dos portugueses aumentou dos 5 para os 8%, e o esforço de poupança traz uma vontade de aplicá-la bem. Quando a rentabilidade do dinheiro é de zero, qualquer coisa que, com segurança, possibilite uma rentabilidade superior, como o imobiliário, torna-se um mecanismo de investimento.
A poupança das empresas voltou a subir, sendo que se verificou uma tendência inflacionista, que, entretanto, travou no primeiro trimestre. Ou seja, houve uma certa tendência inflacionista, que poderia começar a puxar a subida das taxas de juro – e que felizmente estancou – e isto alivia uma certa pressão sobre a banca. A pressão sobre a banca já era muita com as moratórias de crédito e o lay-off. Esse tipo de situação cria um contexto de preocupação. Mesmo o cidadão comum ouve as notícias, achando que a partir de setembro poderá acontecer qualquer coisa… De certo modo, essa ideia poderia travar o investimento imobiliário. No entanto, percebemos que isso não aconteceu.
A pandemia tem sido claramente diferente da crise anterior…
Esta estabilidade económica de longo prazo – fruto dos mecanismos de proteção que os bancos centrais conseguiram impor – diferiu do que aconteceu quando esteve cá a Troika. Na altura eram poucos países em causa, e agora todos os países tiveram de se unir. O que aconteceu foi que os preços de transação imobiliária não sofreram um decréscimo. Muito pelo contrário. As pessoas podem dizer que, mesmo tendo comprado um imóvel no início de 2020, se agora o quisessem vender, não perderiam dinheiro, principalmente considerando que o dinheiro não tem uma rentabilidade superior noutro tipo de investimentos.
Houve de facto uma diminuição no fim de 2020, mas, por exemplo, no primeiro trimestre de 2021, transacionaram-se 50 mil habitações. Esse número é muito significativo e só teve paralelo com o período áureo do setor, antes do início da pandemia.
O que temos de perceber é que neste último ano, 30% da habitação que foi comprada na área metropolitana de Lisboa, e no Porto e Algarve, foi por estrangeiros que, tipicamente, compram a pronto, sem recurso a crédito. De certo modo, este fenómeno fez com que os preços de compra e venda residenciais não sofressem um decréscimo, como se imaginava, e aconteceu, de facto, há 10 anos. De abril de 2020 a abril de 2021, tivemos apenas 2 meses com uma variação negativa mensal do valor dos imóveis. O que se nota é que essa variação decresce cada vez mais…e se nada mudar podemos ter um semestre e um ano seguinte diferentes.
Qual a justificação para não caírem os preços e de, pelo contrário, subirem e de haver muitas transações?
Há indicadores difíceis de apurar. Houve unidades transacionadas e vendidas, mas depende de quem é que as comprou. E os que o fazem podem estar a fazê-lo numa ótica de investimento.
Seja como for, é um facto que, com o fim das moratórias, há pessoas que não vão conseguir pagar ao banco. Há, portanto, produto que vai entrar no mercado por via do incumprimento. Isso tem de ser gerido pela banca, para bem de todos. Estima-se que sensivelmente 15% das moratórias tenham essa questão. Vai ter de haver uma subida do nível de risco percecionado pela banca, o que vai dificultar o acesso a crédito. Isto faz com que mais portugueses tenham de recorrer ao arrendamento para ter acesso à habitação. E vão de arrendar uma casa que alguém teve de adquirir. Como há sempre pessoas com uma estrutura financeira mais forte, essas pessoas já estão a aproveitar para criar carteiras de imóveis para colocar no mercado de arrendamento.
Em Portugal, mesmo as construções novas são feitas por investidores e estão a ser pensadas para serem colocadas no mercado de arrendamento. Eles sabem que o acesso à habitação própria pelos portugueses vai ser mais difícil no futuro.